24.8.07

Mentalidades: Diário de um escravo

É o que se diz hoje em dia: eles que vão trabalhar. Irrita-nos cada vez mais que os outros não trabalhem, que não paguem, que tenham regalias. E então achamos bem que os estudantes paguem os seus próprios estudos, que sejam suprimidos os subsídios de refeições, que se acabe com o 13º mês, que se aumente a idade da reforma, que se acabe com o ADSE. O mundo é dos que trabalham 14 horas por dia, os outros são preguiçosos, não querem trabalhar. Pois se eles têm dinheiro para tirar férias no Algarve, não têm dinheiro para pagar o medicamento sem comparticipação do estado? Vão trabalhar, malandros, que não tenho de ser eu a sustentar-vos. Então os funcionários públicos são uma praga, sobem automaticamente na carreira sem fazer nadica de nada.

O que é bom é que se faça justiça, daquela em que se traduz em aumentar impostos, e a OTA e o TGV é o progresso, força com isso.

Eu penso assim porque trabalho 14 horas por dia para a minha empresa, sem receber mais pelas horas extraordinárias, e isso não me deixa tempo para pensar que estou a ser explorado e a vomitar a propaganda que me alimentaram. Não vejo que os reformados viveram num mundo que tinha regras diferentes do meu, que há pobres que são mesmo pobres, que o 13º mês podia ter sido pago ao longo do ano e que por isso é complemento de salário e não uma benesse não merecida. Penso que no estrangeiro é que é mas esqueço-me que lá as pessoas são bem pagas e valorizadas e por isso mesmo produzem mais. Digo mal dos funcionários públicos mas esqueço-me que estes não têm a culpa de estar mal distribuidos e das lideranças não terem cabecinha. Acho que o mais importante é trabalhar mas sobrecarrego a minha esposa que tem de tomar conta das criancinhas, o que acumula com o empregozeco que tem mas sem o qual eu nunca teria capacidade financeira para poder arriscar na carreira. Acho que os portugueses trabalham pouco mas não penso nos nórdicos que trabalham das 9 às 5, com bons resultados.

Mas o mais grave é que por ter vendido a alma ao capitalismo, esqueci-me que o mais importante são as pessoas, é viver e ser feliz e partilhar a felicidade com os outros. Ou se calhar não me esqueci. Sou um ganancioso do caraças ou um anti-social e invejo as pessoas que têm vida própria. Melhor pensar no lucro...

2 comentários:

Momentos disse...

Pensar produtividade e não em horas excessivas. Mudança de mentalidade exige-se.

/me disse...

Isso foi o que disse ao homem que me veio com esta conversa. ;)