9.2.07

Arrufos filosóficos?!, do blog Maurice

Não sei se é de estar apaixonado, mas dá-me menos para pensar no mundo, e para colocar questões. Mas há sempre quem o faça, e por essa internet fora encontram-se exemplos interessantes.

Vem isto a propósito deste post encontrado no blog Maurice (o qual apresento numa versão truncada; merece ser lido na versão original):


"A questão da existência, ou não, de uma cultura gay é recorrente.

Talvez se possa falar de uma "sub-cultura", fragmentada e sem grande lógica interna. Mas não é essa suposta cultura gay que me interessa [...]. A questão que me desperta a atenção é a possibilidade, ou não, de falar de uma "ética gay" [...]. Parece uma contradição: como falar de uma "ética gay", se até uma hipotética sub-cultura é incipiente? No entanto, parece-me que a afirmação da homossexualidade se tem feito não tanto pela afirmação de uma cultura, mas mais pela rejeição de uma moral. Ou seja, no cerne das fragmentadas manifestações de uma suposta corrente cultural há, a meu ver, uma inquieta busca de enquadramento ético.
Tem isto a ver com o inato funcionamento da consciência. Inato ou fruto da precoce socialização, pouco releva para o caso. O ser humano necessita, em consciência, uma legitimação da sua conduta.

Ora, parece-me situar-se aqui o profundo anseio de justificação ética sentido pelas pessoas homossexuais. Se a afirmação se faz pela rejeição de uma moral dominante, isso não significa imoralidade nem, muito menos, amoralidade. Significa, isso sim, uma busca de uma nova ética que enquadre, justifique e tranquilize a consciência.
Mas a verdade é que, actualmente, a dita "sub-cultura" homossexual mais não conseguiu fazer que consolidar a rejeição de uma moral desapropriada à sua natureza."


Resumindo para o que me interessa mais: existe uma ética gay? Que valores sobram quando se rejeita a moral maioritária da sociedade, num único aspecto que seja? Quando passamos a escolher aquilo que achamos ser correcto e o que achamos ser incorrecto, com que critério o fazemos? Vale tudo, vale apenas o que nos interessa (o famoso a la carte), ou há valores mais profundos em função dos quais fazemos as nossas escolhas? Somos levados pela corrente das nossas conveniências, ou existe um rumo corajosamente contra a corrente?

Por mim, acho que a sexualidade não deve ser determinante na construção da ética. Nas circunstâncias em que vivemos, existe um aspecto específico da ética aplicável a homossexuais: o respeitar a privacidade de quem sabemos que é homossexual, não revelando a sua sexualidade aos outros. De resto, ir contra o espírito dos tempos quando necessário é obrigação ética de todos. A moralzinha de conveniências e tradições tem mesmo de ser rejeitada; não se pode é mandar fora o bebé com a água do banho rejeitando o que faz sentido. Milhares de anos de civilização (no caso da sociedade ocidental, de cariz judaico-cristão) produziram ensinamentos aos quais não se pode ser indiferente.

Mas a procura de uma nova ética não é feudo de nunhum grupo definido por uma qualquer característica. Deveria ser obrigação de todos rejeitar a moral da época, quando apresentada como edifício acabado e perfeito, e explorar os fundamentos éticos. Nisso estamos todos no mesmo barco: não é uma "luta" dos homossexuais, mas sim das pessoas de boa fé. Ou seja, acho que não se coloca a questão da existência de uma ética gay, mas sim a necessidade de uma ética humana, válida para todos.

2 comentários:

Maurice disse...

/me,

Quanta honra ser citado aqui, por tão ilustre relapso!
Claro que os gays não devem ter uma ética autónoma, mas participar daquilo a que chamas "ética humana" geral. Mas têm de ser eles a "situar-se".
E bem sabemos que rejeitar a "moral dominante" não chega.

/me disse...

Maurice, confesso que o que escreveste tu, gostaria de ter escrito eu. :)

Acho que levantaste questões fundamental, que têm de ser explicitada; as pessoas têm de ter consciência dos processos que descreveste, para não andarem aos trambolhões.